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Crónica
Póvoa
de Varzim, 22 de Fevereiro de 2013
“Correntes
d`Escritas”
A
intensidade imposta pelo programa das Correntes d´Escritas é uma característica
benéfica para quem procura pluralidade de escolhas.
Esta
manhã, optei, dentro da diversidade existente, por acompanhar Richard Zimler,
Inês Pedrosa e Hélder Macedo, na visita à Escola Secundária Eça de
Queirós.
Cheguei
à escola antes dos autores. Os alunos, a julgar pelo sossego nos corredores,
estavam dentro das salas.

Saíram.
Por momentos, fiquei sozinho. Sem livros e sem leitores. Só o silêncio.
As
palavras são mais bonitas quando lidas para outros ouvirem. As mesmas palavras
sopradas por mim, lisboeta, ou por Zimler, escritor nascido nos EUA, seriam
diferentes. Não teriam a pronúncia do norte. O imaginário que elas invocam
diverge de falante para falante, de leitor para leitor. São as mesmas, mas têm,
em si, muitas experiências.
Quando
os escritores e os alunos chegaram ao auditório, os imaginários coabitaram. A
sala encheu. O burburinho foi aumentando para, depois, se dissolver.
Após
um silêncio reverencial, foram os leitores que, simbolicamente, se apropriaram
das palavras que eu já tinha ouvido, momentos antes, e apresentaram os autores.
Não mencionaram idade, profissão, prémios nem nacionalidades. Pegaram nos
livros e leram.
Foi
o texto dos autores nas vozes dos leitores que apresentou o que interessa: a comunhão
da literatura. A reverência à palavra.
A
interacção foi profícua. Durante as duas horas de duração, os escritores
mencionaram a importância destas iniciativas. São uma actividade cívica.
“Um
escritor é um cidadão que escreve. Não é outra coisa”, disse Hélder Macedo.
Depois
explicaram alguns processos relacionados com a escrita: a obsessão pelas
personagens, a imprevisibilidade dos caminhos narrativos, as insónias, a luta
contra a artificialidade da obra.
Inês
Pedrosa referiu a busca e registo de histórias na imprensa. As suas histórias
começam em situações concretas e evoluem ficcionalmente. Já Hélder Macedo
refere que a sua curiosidade incide sobre uma personagem que ainda não existe.
É o oposto do concreto de Inês Pedrosa. A partir daí, ele constrói parte da
história. Posteriormente, segundo o próprio, acontece um momento de crise. É a
metamorfose. A partir daí o autor não sabe mais o que vai acontecer.
Apesar
de algumas diferenças de processos, há uma necessidade em comum: o isolamento.
A
solidão é parte essencial do processo criativo.
Richard
Zimler e Inês Pedrosa conseguiram prender a atenção do público e motivaram
várias interacções. Hélder Macedo, no entanto, foi mais longe.
A
capacidade de comunicação do escritor português, que já foi professor de
Literatura em Londres, convenceu quem o ouvia.
A
adaptação da linguagem aos seus interlocutores, a capacidade de descodificação
dos textos, a tentativa (sucedida) de mostrar o divertimento existente num
texto codificado e mais fechado, fizeram das intervenções de Hélder Macedo
“chaves de leitura” que os alunos, estou certo pelo retorno que deles recebi,
irão aproveitar.
No fim, a sala voltou a ficar vazia, e as palavras sumiram pelos corredores.
No fim, a sala voltou a ficar vazia, e as palavras sumiram pelos corredores.
Mário
Rufino
Mariorufino.textos@gmail.com
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