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"Os Vampiros" (Companhia das Letras), de Juan Cavia e Filipe Melo



“Os Vampiros”: A insaciável sede de sangue.  

  

Dizem que quem vê caras não vê corações. No caso de “Os Vampiros” (Companhia das Letras), de Filipe Melo e Juan Cavia, a beleza exterior coincide com a excelência do conteúdo.  
Sendo um livro belo, de encadernação e grafismo apelativos, o argumento de Filipe Melo, a arte de Juan Cavia e a legendagem de Pedro Semedo suplantam as expectativas provocadas pelo primeiro contacto.  
O tema é-nos caro: A guerra colonial.  
A 15 de Março de 1961, Portugal assistiu a uma revolta em Angola que viria a alastrar-se à Guiné e a Moçambique. A guerra durou 13 anos. Viria a terminar com a revolução de 25 de Abril de 1974.  
“Os Vampiros” acontece na Guiné. Desde São Domingos, no Rio Cachéu, em Dezembro de 1972, a operação especial parte para fazer o reconhecimento de uma base do PAIGC junto à fronteira com o Senegal.


É uma descida ao inferno, uma descida à mente de um coronel Walter E. Kurtz, como em “O coração das trevas”, de Joseph Conrad. Vão ao fundo deles próprios e por lá ficam aprisionados.  
A dinâmica do grupo de comandos permite a caracterização individual e a própria criação do pelotão como uma entidade autónoma. O desenvolvimento psicológico é muito bem gizado, com a lentidão bem medida, que vai desde a alcunha de cada um (Totobola, por causa da sorte; Fátima pela cidade onde nasceu) até ao fim da queda. A desagregação do grupo acontece em sintonia com a perda de equilíbrio emocional dos seus elementos. No fim, resta o corpo de poucos sobreviventes, uma casca vazia, despojada de humanidade. Na sede de sangue, vão deixando o deles.  
A racionalidade é abandonada e os medos vão roubando a pouca luz que lhes ainda resta.  
“Os Vampiros” oferece-nos cores saturadas, horror ao vazio, planos alargados e planos centrados nas microexpressões reveladoras do pensamento dos personagens.  
Não são precisos muitos passos para o leitor perceber que está a acompanhar uma descida, algo que não pode acabar bem. Ainda assim, o argumento não deixa de nos surpreender com as suas matizes e acontecimentos.  
Filipe Melo e Juan Cavia, autores multipremiados com “A Balada para Sophie”, dão-nos uma belíssima história de terror; põe-nos em frente do que gerações anteriores não querem pensar e muito menos falar. O ser humano conheceu o limite de si mesmo e não gostou do que viu.


 

 

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